O ano de 2021 iniciou-se com a habitual rotação semestral na Presidência do Conselho da União Europeia, onde António Costa, primeiro-ministro de Portugal sucedeu a Angela Merkel enquanto responsável máximo pelo organismo. A presidência portuguesa ocorreu numa conjuntura especialmente crítica para a UE, com a pandemia de Covid-19 a afirmar-se como o maior choque enfrentado pelo continente desde o início do projeto comum e com a saída do Reino Unido da União Europeia (UE) a afigurar-se igualmente como um desafio à coesão socioeconómica da comunidade.

Neste contexto, o primeiro-ministro destacava, na altura, que, mais do que nunca, era “tempo de agir”, nomeadamente, no que se refere ao “processo de vacinação”, à “recuperação económica e social”, ao “reforço da autonomia estratégica de um continente aberto ao mundo” e à “emergência climática”, culminando no mote “Tempo de agir: por uma recuperação justa, verde e digital”.

Simultaneamente, era expectável que Portugal privilegiasse as relações internacionais, numa altura em que a hegemonia europeia se encontrava e ainda se encontra em jogo, dado o envelhecimento populacional, os problemas de produtividade, alguma ineficiência na gestão da pandemia e, naturalmente, a rápida ascensão da China.

Alguns dossiês, como o Orçamento comunitário para o período entre 2021 e 2027 e o Fundo de Recuperação da UE para fazer face aos impactos económicos da pandemia, revelaram-se especialmente importantes no mandato português, defendendo António Costa uma “resposta comum europeia” tendo em vista uma reemergência bem-sucedida do bloco na sequência dos desafios que hoje se lhe colocam.

Face a este momento decisivo para o futuro da UE, e findo o mandato português à frente do organismo, a opinião pública divide-se em relação a qual o rumo a seguir. Enquanto uns defendem maior integração, presumivelmente à custa da transferência de soberania nacional para instituições europeias, visando corrigir as falhas na arquitetura da UE, a outros falta a vontade política para aprofundar as relações dentro da comunidade.

Neste capítulo, Portugal tem sido particularmente incisivo na defesa da partilha de risco entre os Estados-membros, com António Costa a saudar a criação do já referido Fundo de Recuperação, financiado pela emissão de dívida comum, o que representa um passo que, mesmo tendo enfrentado forte resistência por parte do Grupo dos Frugais, nunca antes a UE se disponibilizara a dar.

Ainda que seja uma dimensão de desacordo relevante no seio da UE, o equilíbrio entre federalismo e intergovernamentalismo não é o único motivo de divergência. Com efeito, também em matéria de política externa se denotou alguma crispação durante a liderança de Costa, com o líder da bancada dos Verdes no hemiciclo europeu, Philippe Lamberts, a criticar o objetivo da nova presidência de concluir o acordo de livre comércio entre a UE e o Mercosul, que diz poder agravar a crise climática que o mundo enfrenta.

Neste âmbito, de salientar que uma das prioridades de Costa seria reconstruir a relação com a Índia, com os EUA de Joe Biden e com o Reino Unido no pós-Brexit, no sentido de se reforçar o poder geopolítico do Velho Continente no contexto mundial. Igualmente interessante foi entender a postura adotada pela UE na negociação de acordos internacionais, campo no qual alguns receavam uma atitude de submissão, que pode reduzir a UE à insignificância, enquanto outros advogavam a favor de maior cooperação com os parceiros estratégicos, visando cimentar a posição da Europa no mundo.

Em relação ao clima, a presidência portuguesa pautou-se por algumas dificuldades, já que o Parlamento Europeu e o Conselho da UE pareceram querer andar a diferentes velocidades. De facto, enquanto os eurodeputados ambicionam reduzir as emissões de CO2 em 60% até 2030, os Estados-membros recusam-se a ir além dos 55%. Também este parece ser terreno fértil para debate futuro, sendo pertinente refletir até que ponto a política ambiental deve estar eminentemente sob alçada comunitária (Parlamento Europeu) ou nacional (Conselho da UE).

Finalmente, as relações diplomáticas intracomunitárias revelaram-se outro desafio durante a liderança de António Costa, dado o clima de animosidade que se vive entre Hungria e Polónia (pertencentes ao Grupo de Visegrado) e as instituições europeias. Recorde-se que a aprovação do Orçamento da UE e do Fundo de Recuperação foi inicialmente bloqueada pelos dois países, não tendo sido fácil desatar o nó. Na génese do conflito, encontra-se o condicionalismo dos fundos europeus ao respeito pelo Estado de Direito, ponto relativamente ao qual existem dúvidas no que respeita aos dois países referidos.

Verifica-se, deste modo, que Portugal protagonizou um mandato desafiante à frente do Conselho da UE, tendo sido necessário gerir conflitos de interesses entre as instituições com astúcia política. Este foi um dos temas em discussão entre os dias 5 e 9 de abril de 2021 na sexta edição do Economia Viva, um ciclo de conferências realizado anualmente pelo Nova Economics Club (NEC) e pela Nova Students’ Union, que pode agora rever na página oficial de Facebook do NEC.

O artigo exposto resulta da parceria entre o Jornal Económico e o Nova Economics Club, o grupo de estudantes de Economia da Nova School of Business and Economics.